Tuesday, August 16, 2011

Um poema

Retrato do poeta

Quando a luz desaparecer de todo,
Mergulharei em mim mesmo e te procurarei lá dentro.

A beleza é eterna.
A poesia é eterna.
A liberdade é eterna.
Elas subsistem, apesar de tudo.

É inútil assassinar crianças. É inútil atirar aos cães os que,
de repente, se rebelam e erguem a cabeça olímpica.
A beleza é eterna. A Poesia é eterna. A liberdade é eterna.
Podem exilar a poesia: exilada, ainda será mais límpida.

As horas passam, os homens caem,
A poesia fica.

Aproxima-te e escuta.
Há uma voz na noite!

Olha:
É uma luz na noite!


Emílio Guimarães Moura (14 de agosto de 1902, Dores do Indaiá — 28 de setembro de 1971, Belo Horizonte)

Tuesday, November 07, 2006

DOIS POEMAS DE DONIZETE GALVÃO


ORAÇÃO NATURAL

Fique atento
ao ritmo,
aos movimentos
do peixe no anzol.
Fique atento
Às falas
das pessoas
que só dizem
o necessário.
Fique atento
aos sulcos
de sal
de sua face.
Fique atento
aos frutos tardios
que pendem
da memória.
Fique atento
às raízes
que se trançam
em seu coração.

A atenção:
forma natural
de oração.

Donizete Galvão, em “Mundo mudo”


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LEMBRANÇA de SEVERO SARDUY

Ao ferir
com a tesoura
a haste
da manga,
escorre
o líquido,
visco
oloroso
prenunciando
nas ventas
o doce gozo.
Antecipação
do paraíso
na tarde calorenta
do gelado
suco de manga
deslizando
na garganta.


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Dedicado ao único blogger que - uma honra para mim - colocou este blog entre seus preferidos.

Obrigada ao poeta Henrique Manuel Bento Fialho.
De facto, tudo o que gostaria de ser era ou ser irônica, mordaz e sarcástica como a Cynthia do Cyncity ou então gostar e saber muito a respeito da POESIA e tudo que é circunvizinho a ela, como HMBF sabe.

Obrigada.
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Sobre Donizete Galvão:
Este excelente poeta, que não é mais conhecido porque não é dado a badalações literárias, ou extra-literárias, Donizete Galvão nasceu em Borda da Mata, MG; é jornalista e publicitário, autor dos livros de poesia:
Azul navalha (1988), TA Queiroz Editor, Prêmio APCA de Revelação de Autor e indicação para o Prêmio Jabuti),
As faces do rio (1991, Água Viva Edições),
Do silêncio da Pedra (1996, Arte Pau-Brasil),
A carne e o tempo (1997, Nankin) e
Ruminações (1999, Nankim).

A sua página pessoal na Web (Internet) é esta: DONIZETE GALVÃO

Wednesday, October 25, 2006

THE UNENDING GIFT/ARTE POÉTICA

JORGE LUÍS BORGES

THE UNENDING GIFT

Tradução de Carlos Nejar e Alfredo Jacques

Um pintor nos prometeu um quadro.
Agora, em New England, sei que morreu. Senti,
como outras vezes, a tristeza de
compreender que somos como um sonho.
Pensei no homem e no quadro perdidos.
(Só os deuses podem prometer, porque são
[ imortais.)
Pensei num lugar prefixado que a tela não
[ ocupará.
Pensei depois: se estivesse aí, seria com o tempo
uma coisa a mais, uma das vaidades ou
hábitos da casa; agora é ilimitada,
incessante, capaz de qualquer forma e
qualquer cor e a ninguém vinculada.
Existe de algum modo. Viverá e crescerá como
uma música e estará comigo até o fim.
Obrigado, Jorge Larco.
(Também os homens podem prometer, porque na
[ promessa há algo imortal.)


THE UNENDING GIFT

Un pintor nos prometió un cuadro.
Ahora, en New England, se que ha muerto. Sentí
como otras veces, la tristeza y la sorpresa
de comprender que somos como un sueño.
Pensé en el hombre y en el cuadro perdidos.
(Sólo los dioses pueden prometer, porque son
[ inmortales).
Pensé en el lugar prefijado que la tela no ocupará.
Pensé después: si estuviera ahí, sería con el
tiempo esa cosa más, una cosa, una de las
vanidades o hábitos de mi casa; ahora es
ilimitada, incesante, capaz de cualquier
forma y cualquier color y no atada a
ninguno.
Existe de algún modo. Vivirá y crecerá como una
música, y estará conmigo hasta el fin.
Gracias, Jorge Larco.
(También los hombres pueden prometer, porque
[ en la promesa hay algo inmortal).

De Elogío de la Sombra, 1969
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ARTE POÉTICA

Tradução de Rolando Roque da Silva

Mirar o rio, que é de tempo e água,
E recordar que o tempo é outro rio,
Saber que nos perdemos como o rio
E que passam os rostos como a água.

E sentir que a vigília é outro sonho
Que sonha não sonhar, sentir que a morte,
Que a nossa carne teme, é essa morte
De cada noite, que se chama sonho.

E ver no dia ou ver no ano um símbolo
Desses dias do homem, de seus anos,
E converter o ultraje desses anos
Em uma música, um rumor e um símbolo.

E ver na morte o sonho, e ver no ocaso
Um triste ouro, e assim é a poesia,
Que é imortal e pobre. A poesia
Retorna como a aurora e o ocaso.

Às vezes, pelas tardes, uma face
Nos observa do fundo de um espelho;
A arte deve ser como esse espelho
Que nos revela nossa própria face.

Contam que Ulisses, farto de prodígios,
Chorou de amor ao avistar sua Ítaca
Humilde e verde. A arte é essa Ítaca
De um eterno verdor, não de prodígios.

Também é como o rio interminável
Que passa e fica e que é cristal de um mesmo
Heráclito inconstante que é o mesmo
E é outro, como o rio interminável.

ARTE POÉTICA

Mirar el río hecho de tiempo y agua
y recordar que el tiempo es otro río,
saber que nos perdemos como el río
y que los rostros pasan como el agua.

Sentir que la vigilia es otro sueño
que sueña no soñar y que la muerte
que teme nuestra carne es esa muerte
de cada noche, que se llama sueño.

Ver en el día o en el año un símbolo
de los días del hombre y de sus años,
convertir el ultraje de los años
en una música, un rumor y un símbolo,

ver en la muerte el sueño, en el ocaso
un triste oro, tal es la poesía
que es inmortal y pobre. La poesía
vuelve como la aurora y el ocaso.

A veces en las tardes una cara
nos mira desde el fondo de un espejo;
el arte debe ser como ese espejo
que nos revela nuestra propia cara.

Cuentan que Ulises, harto de prodigios,
lloró de amor al divisar su Itaca
verde y humilde. El arte es esa Itaca
de verde eternidad, no de prodigios.

También es como el río interminable
que pasa y queda y es cristal de un mismo
Heráclito inconstante, que es el mismo
y es otro, como el río interminable.

De El Hacedor (1960)

Wednesday, October 18, 2006

15 (Pablo Neruda, 1924)

Me gustas cuando callas porque estás como ausente,
y me oyes desde lejos, y mi voz no te toca.
Parece que los ojos se te hubieran volado
y parece que un beso te cerrara la boca.

Como todas las cosas están llenas de mi alma,
emerges de las cosas llena del alma mía.
Mariposa de sueño, te pareces a mi alma,
y te pareces a la palabra melancolía.

Me gustas cuando callas y estás como distante.
Y estás como quejándote, mariposa en arrullo.
Y me oyes desde lejos, y mi voz no te alcanza.
Déjame que me calle con el silencio tuyo.

Déjame que te hable también con tu silencio
claro como una lámpara, simple como un anillo.
Eres como la noche, callada y constelada.
Tu silencio es de estrella, tan lejano y sencillo.

Me gustas cuando callas porque estás como ausente.
Distante y dolorosa como si hubieras muerto.
Una palabra entonces, una sonrisa bastan.
Y estoy alegre, alegre de que no sea cierto.

Tuesday, October 17, 2006

SHAKESPEARE - SONETO 89

Sonnet #89

LXXXIX.

Say that thou didst forsake me for some fault,
And I will comment upon that offence;
Speak of my lameness, and I straight will halt,
Against thy reasons making no defence.
Thou canst not, love, disgrace me half so ill,
To set a form upon desired change,
As I'll myself disgrace: knowing thy will,
I will acquaintance strangle and look strange,
Be absent from thy walks, and in my tongue
Thy sweet beloved name no more shall dwell,
Lest I, too much profane, should do it wrong
And haply of our old acquaintance tell.
For thee against myself I'll vow debate,
For I must ne'er love him whom thou dost hate.

Saturday, October 07, 2006

GREGÓRIO MATTOS


Nasce o Sol, e não dura mais que um dia,
Depois da Luz se segue a noite escura,
Em tristes sombras morre a formosura,
Em contínuas tristezas a alegria.

Porém se acaba o Sol, por que nascia?
Se formosa a Luz é, por que não dura?
Como a beleza assim se transfigura?
Como o gosto da pena assim se fia?

Mas no Sol, e na Luz, falte a firmeza,
Na formosura não se dê constância,
E na alegria sinta-se tristeza.

Começa o mundo enfim pela ignorância,
E tem qualquer dos bens por natureza
A firmeza somente na inconstância.


Link: http://www.ufba.br/~gmg/

Monday, October 02, 2006

KAVÁFIS

TEÓDOTO

Se verdadeiramente estás entre os eleitos,
cuida de como adquiriste predomínio tal.
Por mais que te glories, por mais que
as cidades da Itália e da Tessália

te celebrem os feitos em alta voz,
por mais decretos honoríficos que votem
os admiradores teus de Roma,
nem alegria nem triunfo hão de durar-te,
nem te acharás um homem superior (superior?)

quando, em Alexandria, Teódoto te leve,
sobre um pedaço de pano ensangüentado,
a mísera cabeça de Pompeu.
E não confies em que, na tua vida
limitada, regrada, tão pedestre,
nada aconteça de terrível, teatral.
Talvez neste mesmo instante a bem cuidada
casa do teu vizinho seja invadida
por - invisível, imaterial - Teódoto
levando uma cabeça pavorosa.

Konstantinos Kaváfis
Tradução José Paulo Paes

Monday, September 25, 2006

MONÓLOGO DE ORFEU

Orfeu (sorrindo):


Mulher mais adorada!
Agora que não estás, deixa que rompa
O meu peito em soluços! Te enrustiste
Em minha vida; e cada hora que passa
E' mais porque te amar, a hora derrama
O seu óleo de amor, em mim, amada...
E sabes de uma coisa? cada vez
Que o sofrimento vem, essa saudade
De estar perto, se longe, ou estar mais perto
Se perto, - que é que eu sei! essa agonia
De viver fraco, o peito extravasado
O mel correndo; essa incapacidade
De me sentir mais eu, Orfeu; tudo isso
Que é bem capaz de confundir o espírito
De um homem - nada disso tem importância
Quando tu chegas com essa charla antiga
Esse contentamento, essa harmonia
Esse corpo! e me dizes essas coisas
Que me dão essa fôrça, essa coragem
Esse orgulho de rei. Ah, minha Eurídice
Meu verso, meu silêncio, minha música!
Nunca fujas de mim! sem ti sou nada
Sou coisa sem razão, jogada, sou
Pedra rolada. Orfeu menos Eurídice...
Coisa incompreensível! A existência
Sem ti é como olhar para um relógio
Só com o ponteiro dos minutos. Tu
És a hora, és o que dá sentido
E direção ao tempo, minha amiga
Mais querida! Qual mãe, qual pai, qual nada!
A beleza da vida és tu, amada
Milhões amada! Ah! criatura! quem
Poderia pensar que Orfeu: Orfeu
Cujo violão é a vida da cidade
E cuja fala, como o vento à flor
Despetala as mulheres - que êle, Orfeu
Ficasse assim rendido aos teus encantos!
Mulata, pele escura, dente branco
Vai teu caminho que eu vou te seguindo
No pensamento e aqui me deixo rente
Quando voltares, pela lua cheia
Para os braços sem fim do teu amigo!

Vai tua vida, pássaro contente
Vai tua vida que eu estarei contigo!



Reproduzido do livro 'Orfeu da Conceição', Livraria S. José, Rio, 1960.

O R F E U -Ao que tudo indica, Orfeu foi um poeta trácio de grande habilidade musical e um místico de grande carisma, mas cujos traços históricos estão para nós completamente perdidos, a não ser pelas lendas e mitos que nos chegaram a seu respeito, transformando-o num semideus.
Já no século VI a. C. o poeta Ibico falava de "Orfeu de nome famoso", testemunhando a grande notoriedade que Orfeu usufruia em toda a cultura helênica, e que só se explica pela existência de um fundador carismático e pela difusão do seu movimento religioso.
Eurípedes, Platão, Heródoto, Aristófanes e Aristóteles nos deixaram escritos sobre o orfismo, e sabemos o quanto Platão deve aos mistérios órficos em sua filosofia, especialmente no que concerne à doutrina da reencarnação.
É bem provável que o homem Orfeu tenha tido uma forte influência mística na cultura grega no início do século VI a.C.

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Por falar em Orfeu, é de não perder-se de jeito nenhum, a entevista inventada, criada, pelo autor do blog A Voz que nos trai, que é também Poeta.

Monday, September 18, 2006

HAMLET

Hamlet
Hamlet é uma das peças de teatro mais famosas de Shakespeare (1564 - 1616). Foi escrita entre 1600 e 1602 e impressa em 1603


SETE CAMINHOS PARA ENTENDER UM CLÁSSICO:

1) Por que Hamlet tornou-se um clássico?

Tornam-se "clássicas" (no sentido de lembradas, lidas sempre de novo) as obras que criam um modo novo de expressar alguma dimensão da existência. Hamlet traz à superfície algo que, até então, permanecera oculto, vago e, nesse sentido, não existia verdadeiramente. Com Hamlet, sentimos quantas coisas na vida real são encenação. Ele é uma figura que torna plausível as incongruências e verossímeis as loucuras. (Kathrin Rosenfield, prof. da UFRGS)

2) Qual a importância de Hamlet dentro da obra de Shakespeare?

Hamlet está entre as obras que marcaram uma reviravolta na arte de Shakespeare - provavelmente há uma relação com a experiência da morte (Shakespeare perdeu um filho pequeno chamado Hamnet). O que observamos nessa peça é uma forma de narrar que aprofunda prodigiosamente o lado enigmático da natureza humana. Pela primeira vez, temos aí uma técnica da escritura que capta as inúmeras facetas da ambivalência, os sentimentos e gestos contraditórios, tudo aquilo que não sabemos e não dominamos na existência. (Kathrin Rosenfield)

3) Qual o sentido do dilema "ser ou não ser"?

A fórmula de Hamlet refere-se, num primeiro momento, à idéia do suicídio e a um sentimento de fracasso e impotência diante de um mundo fora dos eixos. No entanto, na peça ela remete também à ambigüidade da (auto)encenação e da vida concebida como encenação. O Renascimento criou a consciência do homem dando-se sua própria forma. Nisso, há um lado de liberação. A mesma liberdade tem um avesso: a autonomia moderna suscita o medo de perder-se nas inúmeras formas ficcionais. A consciência da encenação termina por ser inquietante, ela nos dá, às vezes, a sensação de desamparo e abandono. (Kathrin Rosenfield)

4) Por que Hamlet não perde a atualidade?

Porque trata de assuntos que permanecem atuais, como a questão da morte. Nenhum outro texto até hoje expressou tão profundamente a angústia do ser humano em relação à morte, que é uma angústia eterna. Além da trama metafísica, Hamlet traz as tramas política e familiar, que também permanecem atuais. (Jorge Furtado, cineasta)

5) Qual a melhor adaptação de Hamlet para o cinema?

A do inglês Laurence Olivier, de 1948. Além de dirigir, Olivier teve uma ótima atuação no papel-título do filme. Conseguiu melhor que ninguém colocar o fluxo de consciência de Hamlet no cinema, dividindo as falas e pensamentos em partes faladas diretamente pelo personagem e partes narradas em off. (Jorge Furtado)

6) O que se espera de um ator que vai interpretar Hamlet?

A compreensão da totalidade e da complexidade da obra, que até hoje permanece atual e que criou novas perspectivas para a dramaturgia. É um desafio enorme porque o ator deve entender as sutilezas que Shakespeare usou no texto. (Sérgio Silva, cineasta e professor da UFRGS)

7) Por que devo ler Hamlet?

É o texto fundamental da história do teatro. Por ser longo e rico em detalhes, Hamlet ultrapassa os limites teatrais e se transforma em uma obra que aborda também a filosofia, a política e a história. (Sérgio Silva)



Hamlet
"Com Hamlet, sentimos quantas coisas na vida real são encenação. Ele é uma figura que torna plausível as incongruências e verossímeis as loucuras" Kathrin Rosenfield

Wednesday, August 16, 2006

Tuesday, August 15, 2006

Pessoais...

-Amigos, que país é este?
--Ilíria, senhora

Shakespeare [Noite de Reis, I, 2]

Saturday, July 15, 2006

Ilíria

" Mulher alguma saberia suportar os golpes de uma paixão tão forte como a que o amor colocou no meu coração.
Nãop existe coração feminino capaz de resistir-lhe
N. R II,4